Tráfico de Vidas Animais

O comércio ilegal de vida animal silvestre é quase sempre alimentado por crime, quer seja pela reprodução de animais em cativeiro de forma ilegal, quer seja pela retirada destas vidas de seu habitat natural. Normalmente, tratam-se principalmente aves, cobras e primatas, esse tipo de tráfico não se restringe a estes animais, mas a uma variedade tão grande quanto o número de espécies existentes na natureza.

Esses animais são traficados para serem vendidos a colecionadores particulares ou vendidos em pet shops e até para serem usados de forma ilegal em laboratórios sem compromisso, que usam esse meio para obter animais a serem usados em suas pesquisas, chamados nesse tipo de tráfico, especificamente de “biopirataria”.

Foto: Núcleo de Comunicação da PRF Bahia – Roberta Schmidt/Clistenes Silva

Esse crime alimenta um mercado bilionário, criminosos se arriscam, justamente, por conta dos altos lucros obtidos através desta contravenção, mesmo com o risco de pena de reclusão de um a quatro anos mais multa, que é previsto no código penal, como crime ambiental, conforme descrito na Lei nº 9.605, alterada em 2019.

De acordo com a advogada Dra Maria Aparecida Marocci de Sousa Lima, “nesse momento, tramita no congresso nacional, o projeto de Lei 4520/20, que endurece ainda mais a pena para quem pratica o tráfico de espécies silvestres, podendo essa pena passar a variar de três a oito anos, além de multa já prevista”.

Impossível não refletir nas razões pelas quais este contrabando acontece e de que forma é praticado. Às vezes vivemos no piloto automático, sem observar ao redor, na maioria do tempo, sem o devido olhar acerca do que se passa em nossa volta, sem nos importar, como se algumas ações não se transformassem em consequências para todos, sem avaliar a razão ou o porquê das coisas. Faria toda diferença, consciência e reflexão pautadas no entendimento mais profundo das questões.

Então vamos tirar o véu dos olhos e entender como essa ação acontece e quais suas consequências.

O Impacto ambiental causado com a retirada de espécies animais de seu habitat e a forma como este crime acontece

Foto: Núcleo de Comunicação da PRF Bahia – Roberta Schmidt/Clistenes Silva

O tráfico de vidas animais é um grande risco a biodiversidade, causa um severo impacto ao meio ambiente, é responsável pelo extermínio de várias espécies, causando enorme desequilíbrio no ecossistema onde é feita a subtração do animal, uma vez que trata-se de um sistema muito complexo, onde cada uma das espécies tem um papel fundamental e importante dentro desse harmônico equilíbrio, que é cessado quando animais dessa cadeia desaparecem deste ambiente. Para piorar, o maior alvo dos traficantes são exatamente os animais em extinção, exatamente por serem raros, tornam-se mais valiosos, o que se traduz num impacto ainda maior sobre a manutenção das espécies e a biodiversidade.

O crime torna-se ainda mais cruel pela forma como que é praticado. Os animais são transportados das mais impensáveis e variadas maneiras, passam por extremos maus- tratos, difícil para humanos conscientes imaginar essa tortura, que vai muito além da sua captura e que faz sofrer vidas, de forma indescritível, apenas para atender um mercado fútil, irresponsável e egoísta.

Foto: Núcleo de Comunicação da PRF Bahia – Roberta Schmidt/Clistenes Silva

Estes animais são transportados em garrafas pets, em caixas, amontoados, amarrados, muitas vezes são recém-nascidos, arrancados abruptamente e violentamente de seu grupo familiar, de seu habitat, mas estamos aqui falando de vidas, consegue imaginar o que esses animais passam?

Alguns têm o hábito de pensar nos animais, como se eles fossem coisas, seres engraçadinhos para nos divertir, como se eles não sentissem dores, ou não fossem capazes de ter medos, sentimentos, só que eles sentem, caso não saiba.

Além da tortura, das dores, durante esse processo de tráfico, eles são submetidos à fome, sede, então sim, é um processo cruel e muito covarde. Só para se ter ideia sobre a forma perversa de como esse processo acontece, entre a captura, durante o transporte e o cativeiro, de dez animais traficados, apenas um sobrevive.

É dessa forma, que os que sobrevivem, chegam a alguns pets shops, ou aos colecionares, ou ainda, aos laboratórios que os usam de forma clandestina para pesquisas. Mais uma vez, um crime que só acontece, porque existe um receptador, do tipo que muitas vezes não imaginaríamos. Muitos desses animais são encomendas já previamente acertadas de forma criminosa, entre as partes.

Como sociedade, precisamos compreender o nosso papel dentro de processos como esses. Entender que quem compra um animal silvestre, para satisfazer suas vontades, é responsável também pela perpetuação desse crime. Se não houver quem compre também não haverá quem venda.

Foto: Núcleo de Comunicação da PRF Bahia – Roberta Schmidt/Clistenes Silva

Em entrevista com a Policia Rodoviária Federal, PRF Jader Ribeiro, Chefe do Comando de Operações Especiais da PRF-BA e PRF Péricles Alves, Integrante do Comando de Operações Especiais – COE, responderam algumas questões a respeito desse tema, através do Núcleo de Comunicação da PRF na Bahia, PRF Roberta Schmidt, Chefe do Núcleo de Comunicação da PRF BA e pelo Chefe Substituto do Núcleo de Comunicação da PRF BA , PRF Clistenes Silva, para que possamos compreender a dimensão deste problema.

1 – Que espécies de animais são as mais afetadas pelo tráfico?
As aves são as mais procuradas devido a facilidade de captura, ao canto, ornamentação e colecionismo do público final demandante. Os repteis também são muito procurados pelo alto valor de pesquisa científica e estudo.

– Em que condições esses animais são encontrados?
Quase sempre em péssimas condições e maus-tratos. São acondicionados em grande quantidade em pequenos caixotes para serem escondidos e dificultarem as revistas de fiscalização. Muitos morrem durante este transporte.

3 – Quando a PRF consegue apreensão dessas espécies? Que destino é dado a elas?
Os animais são encaminhados aos CETAS ou a Organizações civis autorizadas para readaptação ao meio ambiente.

– Que medidas podem ser tomadas para evitar esse tráfico?
A principal medida é a conscientização das pessoas do mal que causa a retirada de um animal desses do seu habitat, muitas vezes, por puro colecionismo ou satisfação pessoal. A questão do aumento de recursos e materiais para os órgãos competentes de fiscalização e de estudo desse tipo de crime, também é muito importante.

 5 – Houve aumento de apreensão de animais silvestres durante a pandemia?
Houve um decréscimo na ordem de 20% em relação às apreensões nas rodovias devido principalmente a questão da redução do fluxo de pessoas e veículos nas rodovias federais, o que implica diretamente na queda de fiscalizações direcionadas deste tipo de crime. O trabalho conjunto com demais agências e Organizações civis também ficou prejudicado de certa forma por causa da redução das atividades devido a pandemia. Existe também a questão da restrição do fluxo de pessoas via voos comerciais internacionais modalidade de muito peso no volume do tráfico, já que muitos desses animais eram transportados para a Europa em bagagens pessoais. No entanto, já existem nos últimos quatro meses, indicativos de curva de aumento desse tipo de apreensão.

6 – De que forma a PRF atua na repressão contra esse crime?
Atua diuturnamente nas fiscalizações de rotina, investe muitas vezes em operações específicas e capacitações formais de seus agentes para a identificação deste tipo de crime, utiliza os meios de informação e serviços de inteligência para uma análise das maiores rotas e pessoas reincidentes do tráfico de animais silvestres. O trabalho conjunto com órgãos com o ICMBio e IBAMA também são fundamentais.

7 – Qual perfil dos traficantes de animais?
Depende muito do público que demanda a utilização deste animal silvestre. O que pode se afirmar com bastante propriedade é a reincidência. O traficante de animais quase sempre comete seguidas vezes este tipo de crime devido às punições brandas que ele ocasiona.

8 – Qual a punição pra quem trafica e para receptação de animais silvestres?
Detenção, de seis meses a um ano, e multa, com possibilidade de agravantes devido a maus-tratos, nesse momento, lembrando que há projeto de Lei em tramitação para aumentar essa pena.

– Nestes casos, como denunciar estes crimes à PRF?
R
 – As pessoas devem utilizar o 191 ou irem diretamente às diversas Unidades Operacionais espalhadas pelo Brasil. A identidade será sempre preservada.


Os riscos à saúde humana em criar um animal silvestre

Foto: Núcleo de Comunicação da PRF Bahia – Roberta Schmidt/Clistenes Silva

Agora que você já conhece os impactos causados à natureza nesse processo e já entende como ele acontece efetivamente, vamos lhe explicar um pouco sobre os riscos que se corre em relação à saúde quando se decide criar um animal silvestre, quais ameaças à saúde estão envolvidas. Para isso conversamos com a Drª Bruna Smith, Médica Veterinária, para nos contar um pouco sobre esses riscos.

A Dra Bruna Smith afirma que “os pequenos saguis capturados na natureza, ofertados, nessa situação, como se fossem animais domésticos, assim como macaco prego, cobras, iguanas, papagaios, araras, pássaros, entre outros, são todos considerados animais silvestres e estão na lista dos mais procurados entre as pessoas que compram esses animais. Além da possibilidade de cometer crime ambiental, as pessoas que mantêm essas espécies em cativeiro também correm risco de contrair doenças como raiva, uma enfermidade muito preocupante. Os papagaios e araras podem transmitir a psitacose, enfermidade pulmonar que pode matar, e répteis como os jabutis a salmonelose – isso citando apenas alguns animais”.

Esses animais muitas vezes não têm assistência veterinária, não existe como saber se e como foram feitos o controle de parasitas e se receberam as vacinas obrigatórias” diz a Dra Bruna, alertando que doenças como raiva, sarna, dentre outras, podem ser transmitidas ao homem por serem zoonoses.

Existem ainda muitos outros cuidados envolvidos que não são pensados, exatamente, por não se conhecer bem a natureza e convívio com esses animais, criá-los, claramente não recomendável, requer conhecimento no manejo e muita atenção, o dia a dia pode ser tornar um problema sem volta.

A Dra Bruna afirma ainda que “Cada animal desses requer uma alimentação específica de acordo com sua espécie e necessidade nutricional. Apenas um veterinário poderia prescrever e auxiliar nesse manejo, no entanto, por conta do medo de serem denunciados, seus criadores deixam o pobre animal adoecer e não o leva para o veterinário, o que pode causar sua morte. Por tantos motivos, ressalto que lugar de animal silvestre é no seu habitat natural, feliz, solto e protegido, sem sofrer maus-tratos, lembrando que com o ecossistema permanecendo saudável, evitamos problemas com muitas doenças”.

Foto: Núcleo de Comunicação da PRF Bahia – Roberta Schmidt/Clistenes Silva

Mais que uma luta ambientalista, estamos diante de uma pauta humanitária, a nossa existência, depende fundamentalmente da coexistência entre espécies e a natureza. É preciso lançar um olhar lúcido, justo, sensível, sobre essa questão. É preciso maturidade, educação, consciência, que tenhamos a grandeza de propagar a generosidade, a bondade entre todos os habitantes deste planeta, porque essas vidas animais têm tanto direito de viverem livres quanto nós.

Que possamos refletir melhor sobre essa questão. E sejamos mais proativos, denunciar sim o contrabando de animais. Não devemos nos isentar de nossas responsabilidades e umas das formas mais eficientes de não perpetuar esse crime é simples, basta não ser receptador desses animais.

Petshopshow 🐾

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